sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

As contradições performativas brasileiras

 



  


Para a Filosofia da Linguagem de Jürgen Habermas e Karl-Otto Apel a ética do discurso pressupõe uma comunicação social com conteúdos normativos e determinantes das formas de ação. E como o ‘agir’ é justamente o tema da ética, realizar algo oposto ao que se fala é definido inexoravelmente enquanto “contradição performativa”. De sorte, que a atual polarização política nacional com projetos manipuladores e narrativas ideológicas refutadoras da realidade mantém o Brasil longe de ser uma nação Democrata, Republicana e Pacifista.


Integrantes de poderes e grupos políticos não são “Democratas” quando passam por cima da Constituição ou não apresentam paradigmas universais de sua aferição. Por aqui, um grupo político assume ser “relativa” a Democracia para justificar alianças com governos de Cuba, Venezuela, Nicarágua, China, Irã e Rússia. Já outro grupo político solta loas a ditadura (1964-1985) e defende intervenção militar no presente. No ranking de 167 países do The Democracy Index, o Brasil caiu 04 posições em 2022 (51ª) em relação a 2021 (47ª). São cinco os fatores que determinam os países mais democráticos (Noruega, Nova Zelândia, Islândia) e mais autoritários (Afeganistão, Mianmar, Coreia do Norte): pluralismo eleitoral, funcionamento do governo, participação da população, cultura política e liberdades civis. Quesitos que não conseguimos avançar “consensualmente” há décadas.   


No tocante a “Republicano” é quem respeita instituições, poderes e erário. Portanto, incitar conflitos institucionais, confiscar poderes e combater regras anticorrupção é tipificado como alguém que perpetra crime de “lesa pátria”. No Índice de Percepção da Corrupção da Transparência Internacional de 2023, o Brasil caiu 10 posições no ranking ao registrar 36 pontos e ficar na 104ª posição entre 180 países, abaixo da média da América Latina (43). Conforme a percepção de uma escala de 0 a 100, especialistas e empresários analisaram o setor público brasileiro (governos anterior e atual) a partir dos resultados de investigações sobre a corrupção e do empenho e da independência dos investigadores. E nestes critérios ingressamos numa leniência geral ano a ano e de forma nada invejável. 


Na pós-pandemia, incredulamente, o belicismo superou o “Pacifismo”, com Rússia, Hamas/Houthis e Venezuela atacando Ucrânia, Israel/EUA e Guiana. E como na Política Externa quem inicia a guerra por quaisquer motivos comete “crime contra a paz”, não há que se falar em posição nacional neutral ou pró-invasor. O art. 4º da Constituição/1988 aduz que a Política Externa é de Estado (não de governo), Técnica (não ideológica) e juridicamente previsível, tendo como princípios: independência, igualdade e não-intervenção entre as nações; defesa da paz e solução pacífica dos conflitos; autodeterminação e cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; prevalência dos direitos humanos, repúdio ao terrorismo e racismo e concessão de asilo político. Assim, sob o ângulo do Pacifismo, o Brasil tanto tem diferentes governos a esquerda e a direita constantemente ridicularizados nas Relações Internacionais, como é considerado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC/ONU) um dos países mais violentos do mundo por contar, paradoxalmente, com apenas 2,5% da população e quase 20% dos homicídios do planeta.   


Nas linguagens/práticas da Democracia, Republicanismo e Pacifismo, o Brasil é real espelho das poesias concretistas de Renato Russo em Quase sem querer (Mentir pra si mesmo é sempre a pior mentira) e de Humberto Gessinger na Somos quem podemos ser (Quem ocupa o trono tem culpa, quem oculta o crime também, e quem evita a dúvida também tem). Definitivamente, falta-nos um “centro” discursivo e de ação. A começar por um partido hegemonista, hábil e coerente...  


Laércio Noronha Xavier é advogado e professor universitário

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